ROBERTO DE OLIVEIRA
DE SÃO PAULO
O tamborim é o instrumento fetiche do Carnaval: não basta apreciar, tem que tocar.
Nesses dias de folia, o “mala” do tamborim, como é chamado pelos foliões, torna-se ainda mais evidente, seja nas rodas de samba nos botecos, seja nos blocos de rua.
Nos desfiles, sempre há um “global” de tamborim em punho. Recentemente, rainhas de bateria passaram a ostentar o “troféu” nos sambódromos. Ali, no meio daquela massa sonora, qualquer escorregão logo é abafado pela “tropa da bateria” —as escolas de samba desfilam com 300 ritmistas, dos quais 50 integram a ala dos tamborins.
Mas, acreditem, tocar tamborim requer ciência, prática ou habilidade. O instrumento, por exemplo, deve estar afinado.
Ricardo Giovanelli, 37, percussionista da banda Bafo da Lontra, explica que o tamborim é um dos instrumentos que mais dão cadência ao samba. “Só que esses aventureiros não sabem disso.”
Um dos “poderes de sedução” está em seu tamanho, acredita Giovanelli. “O cara sai batendo, acha que está arrasando, mas o que ele faz mesmo é um baita estrago.”
Fã de samba, o professor Fernando Henrique Corrêa Gomes, 30, sempre que pode arrisca “umas batidinhas”.
“Como é pequeno, parece fácil, mas não é”, reconhece. Jura que nunca foi vaiado em suas incursões pelos bares, mas já flagrou olhares tortos disparados pela torcida adversária. Mas não se fez de rogado. “Não vou desistir. Uma hora, eu ainda pego o jeito.”
Nos blocos ou em festa de bar, os integrantes do Bafo da Lontra estão de olho no tamborim. “Na pausa, tem que esconder. Senão, sempre tem um desavisado que vai querer tocar”, diz Giovanelli.
O empresário Danilo Rezende, 34, confessa que faz parte desse time: se está numa roda de samba e vê um tamborim dando sopa, pega e toca, mas faz suas ressalvas: reconhece que o instrumento é difícil e, quando percebe que atrapalha, “tenho bom senso e paro de tocar”.
Diretor de tamborim da Acadêmicos do Tatuapé, Márcio Teixeira de Araújo, 28, credita à expressividade dos ritmistas o fascínio exercido pelo instrumento. Mas, para a turma de cá do balcão, manda um recado: “Quem não sabe não toca”. Não basta “martelar”, precisa ter “exatidão e sincronismo”.
OLHA O RITMO
Difícil é o fora de ritmo passar incógnito. “O som do tamborim é nítido. O erro é perceptível”, diz Higor Osvaldo da Silva, 36, mestre de bateria da Acadêmicos do Tatuapé.
Apaixonada por tamborim desde menina, a cantora Juju Ferreirah, 42, lembra que nunca conseguiu aquela levada de escola de samba.
“Como não posso me satisfazer tocando na Vila Isabel, para não arrasar com a minha escola, toco nos blocos. Se um dia derem nota para os blocos, não toco mais”, diz.
Nascida e criada na música, a filha de Martinho da Vila se sente à vontade para suas batucadas em casa ou nos bares do Rio: “Mas só quando a galera já bebeu todas e aí ninguém percebe mais os meus erros”.
O papel do tamborim é “desenhar as melodias”, segundo Danilo Alves, 30, cavaquinista da Vai-Vai e da casa de shows Terra da Garoa. “No começo do samba, o som dele ‘sobe’, ‘dá um ataque’. Na segunda parte, precisa entrar o ‘teleco-teco’, como são chamados alguns compassos.”
Acostumado a transitar por palcos e avenidas, Alves afirma que pouco importa o lugar: o sonho do brasileiro é transformar o tamborim num pandeiro. “O problema é achar que basta batucar”, diz.
Diante de tanto fascínio, Alves jamais desencoraja os inexpertos por onde se apresenta. “Dá o tamborim para o cara, pô! Se ele não for sair batendo feito doido, tudo bem. E ainda vai ficar feliz da vida”, brinca. Imagine se essa gente animada se aventurar na cuíca. Melhor abafar!